O João Rock 2024, tradicionalmente conhecido por reunir grandes nomes do rock nacional, está prestes a viver um momento histórico. Isso porque dois nomes que representam a potência periférica da música brasileira e latino-americana estão entre as atrações confirmadas: MC Soffia e Fioti. Ambos artistas carregam não só rimas e beats, mas também histórias, ancestralidade e ativismo.
O festival, que acontece em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, tem dado sinais de abertura para além das guitarras e do mosh pit. E a presença de dois expoentes das quebradas é um reflexo de algo maior: o som das margens está, cada vez mais, no centro da cultura.
Aos 20 anos, MC Soffia já é veterana quando o assunto é usar a arte como ferramenta de transformação. Negra, periférica e feminista, ela ganhou os holofotes ainda criança com letras que questionavam racismo, padrões de beleza e a invisibilidade das meninas pretas.
Em entrevista ao Pulso Latino, Soffia contou:
“Crescer sendo uma voz dissonante foi difícil, mas ao mesmo tempo me deu força. Ver meu nome num festival como o João Rock é entender que estamos quebrando muros, não só sonhando com palcos.”
Com um novo EP a caminho e participações em projetos educativos e sociais, MC Soffia representa um Brasil jovem, conectado e consciente — onde ser mulher preta e artista é um ato de resistência diária.
Fioti, por sua vez, é conhecido mundialmente pelo hit “Bum Bum Tam Tam” — um funk viral que cruzou fronteiras e tocou em festas da Alemanha às favelas da Colômbia. Mas o artista vai muito além da pista: ele é cofundador da Laboratório Fantasma, uma das gravadoras independentes mais importantes do país, e responsável por impulsionar carreiras como a de Emicida.
Com um set que promete misturar funk, beats latinos, política e provocação, Fioti vê sua presença no festival como símbolo de ruptura:
“Durante muito tempo, a quebrada foi excluída dos grandes eventos. Agora, a gente não só entra — a gente protagoniza. E isso muda tudo.”
O palco do João Rock se torna, assim, um território de disputa simbólica, onde o som da quebrada ecoa para plateias diversas. Em tempos em que a juventude negra e periférica luta por espaço e voz, ver artistas como MC Soffia e Fioti brilhando em eventos mainstream é mais do que música: é política, identidade e pertencimento.
Para Letícia Andrade, produtora cultural da zona norte de SP:
“Esses artistas levam com eles o Brasil real. Eles carregam as vivências, os sonhos e a estética de um povo que nunca deixou de criar, mesmo sem recursos.”
Se antes a quebrada só aparecia nas letras como cenário, agora ela é personagem principal. E quem escuta com atenção percebe: o som que vem da periferia é, na verdade, o que dita o ritmo do país.