Nem todos viajam em busca de praias paradisíacas ou selfies em pontos turísticos famosos. Uma nova geração de viajantes latinos está refazendo caminhos antigos, mas com um novo propósito: reencontrar a si mesmos por meio das raízes culturais, étnicas e ancestrais que os formaram. Surgiu, assim, o turismo de pertencimento — um movimento que transforma o ato de viajar em um mergulho profundo na identidade.
Esse novo tipo de viagem nasce do desejo de se reconectar com a própria história. Jovens negros visitam quilombos, comunidades afrodescendentes e antigos portos escravagistas. Indígenas retornam a territórios originários em busca de suas línguas, rituais e cosmologias. Filhos da diáspora latino-americana percorrem caminhos esquecidos, visitando vilas andinas, povoados caribenhos e centros culturais onde a memória coletiva ainda resiste ao tempo e ao apagamento.
É um turismo que dispensa o luxo, mas exige escuta. Ao invés de hotéis cinco estrelas, pousadas comunitárias. No lugar de roteiros padronizados, vivências com lideranças locais, festas populares, feiras de rua e rodas de conversa com quem carrega a história no corpo e na fala. Esses viajantes não querem apenas ver — querem sentir, entender, pertencer.
Na Guatemala, viajantes indígenas da diáspora têm voltado às montanhas para participar de cerimônias maias. Na Colômbia, a juventude negra do Pacífico redescobre sua ancestralidade nas canoas, nas danças e nas cantigas de seus antepassados. No Brasil, cresce o interesse por roteiros que passam por terreiros de candomblé, quilombos vivos e aldeias indígenas abertas à visitação respeitosa.
Esse movimento também tem um forte componente político. Ao buscar conexão com suas raízes, os viajantes desafiam a narrativa colonial que por séculos apagou, expropriou ou folclorizou as culturas originárias e afro-latinas. Eles escolhem se reaproximar do que lhes foi negado, reivindicando uma identidade múltipla, complexa e cheia de orgulho.
O turismo de pertencimento também movimenta a economia local. Projetos comunitários ganham força, redes de trocas são fortalecidas e o protagonismo passa a ser das próprias comunidades, que decidem como querem ser vistas e vividas. Não são mais objetos de visitação — são sujeitos da própria narrativa.
Essa tendência aponta para um novo olhar sobre o que é viajar. Um olhar que valoriza a memória, a ancestralidade, a escuta e o respeito. Um olhar que transforma o turista em aprendiz e o destino em espelho.
Porque, no fim das contas, não se trata apenas de chegar a um lugar, mas de voltar para casa — mesmo que seja pela primeira vez.